Estou a menos de um mês da Maratona de Berlim e posso dizer-vos que o meu estado de espírito neste momento é tranquilo. Sei que estou a treinar com foco e qualidade, e isso é o mais importante, aconteça o que acontecer a 16 de Setembro. E treinar com qualidade é conseguir fazer um treino de velocidade, alongar, dormir as horas suficientes, comer bem (fazer as minhas marmitas), ter minhas massagens desportivas… e tudo isto integrado no meu dia a dia de mãe do Caju, apresentadora de TV, gestora de conteúdos e mulher que gosta de vida social, de estar com os amigos e a família. Certo. Está tudo equilibrado.
Ao longo de três meses tenho estado a cumprir um preparação específica para esta maratona. São 42,195 km, que quero fazer num tempo adequado ao que estou a valer, por isso, não me basta treinar resistência, não chega pôr muitos quilómetros nas pernas, é também fundamental treinar velocidade.
As maratonas são provas de estratégia, resiliência, concentração e foco. E eu sei bem aquilo que quero fazer quando chegar a Berlim. Quero correr a um ritmo constante na primeira metade da prova e, depois, ali a partir do km 33 começar a pensar em aumentar gradualmente a velocidade. Para isso, e de acordo com a minha experiência nas maratonas que já corri, sei que preciso de treinar velocidade.
Claro que não vou colocar ritmos de velocidade como se fosse correr uma prova de 10 quilómetros, como é lógico. Tenho como base o meu ritmo confortável que encontrei nos treinos e, a partir daí, vou começar a desafiar o meu corpo, mas sempre atenta aos sinais que ele me vai dando.
Para melhorar a velocidade faço treinos de séries (podem espreitar aqui o meu artigo de series na minha preparação da Maratona de Sevilha), fartleks e treinos como este que fiz há dias. Já tenho vários treinos longos nas pernas (acima dos 20 km), séries curtas e rápidas, por essa razão, neste treino queria correr 10 km a ritmo de Meia Maratona.
E perguntam vocês: “Mas o que é um ritmo de Meia Maratona”? Malta! Cada um tem o seu. O meu, tendo em conta a ultima meia que fiz (Meia Maratona de Munique — espreitem aqui o artigo) ronda os 4’12’’ min/km. Assim sendo, neste treino eu queria andar ali entre os 4’30’’ e os 4’10’’ min/km. Coloco esta margem porque já sei que quando vou e volta da Baía dos Golfinhos (em Caxias) até à Fundação Champalimaud (a chegar a Belém) apanho zonas com vento, ruas estreitas, pequenos declives, pessoas que passam de bicicleta, carros e afins, logo é normal que o ritmo também sofra variações. Posto isto, SIGA!
Fico sempre nervosa quando sei que tenho de começar logo na bolina. Lá está, tenho mente de maratonista — prefiro começar confortável e ir aumentado progressivamente. Mas neste treino não podia ser. Por isso, fiz um aquecimento para despertar o corpo e dizer-lhe “é agora ou nunca”. Mas eu sou exagerada. Mal iniciei o treino, dei por mim num ritmo estável de 4’20’’ min/km e a sentir-me confortável, ou seja, capaz de aguentar esse ritmo durante os 10km. Excelente. Significava que, seguramente, mais à frente, estaria capaz de aumentar o ritmo. Nestes casos, ajuda pensar “Vá, são só 10km. Vai passar num instante”. E passa mesmo, pessoal. É um “tirinho”.
Os que me seguem há mais tempo, devem recordar-se de que já fiz uma prova de 10 km a um ritmo de 3’59’’, e podem achar estranho que isto agora me custe tanto. Mas há uma explicação: correr em treino e correr em provas é completamente diferente. O normal é que nas provas consigamos sempre melhores tempos do que nos treinos. E há muitos fatores que levam a que isso aconteça. Numa prova, o ambiente de festa, o entusiasmo, aumentam-nos a adrenalina e isso faz com que pareça que a nossa energia triplica. Depois, há a música, o apoio das pessoas, os camaradas de corrida, o dorsal, as medalhas…tudoooo! E há ainda outro fator decisivo. As provas são quase sempre em piso liso (alcatrão), com estradas cortadas, onde não temos de contornar obstáculos, subir passeios, existe abastecimentos regulares, ou seja, é muito mais fácil estarmos unicamente concentrados na estratégia, sem alterarmos ritmos.
Voltando ao meu treino de 10 km. Eram 8h30 da manhã, felizmente não estava muito calor, e lá fui eu. Consegui fazer o que tinha planeado, com um ritmo um pouco mais lento nos primeiros 5 km, mais rápido nos 4 seguintes, e o último o mais veloz de todos. Seguem os meus ritmos, para verem:
Km 1: 4’17’’;
Km 2: 4’20’’;
Km 3: 4’21’’;
Km 4: 4’17’’;
Km 5: 4’08’’;
Km 6: 4’09’’;
Km 7: 4’09’’;
Km 8: 4’12’’;
Km 9: 4’12’’;
Km 10: 4’01’’.
A média final foi de 4’13’’ minutos por cada quilómetro, o que para mim é top mundial. Mas a corrida não foi constante. Na minha cabeça, fui sempre a gerir, a fazer contas, a escutar o corpo.
Em que é que pensamos quando estamos a correr?
Quando comecei, e mal liguei o relógio, como sempre, adotei a minha postura positiva e guerreira. De que é que vale pensarmos que vai ser difícil ou que vamos sofrer? Isso só nos tira o estímulo e a motivação.
No primeiro quilómetro, não gosto de olhar para o relógio, porque ainda estou a despertar o corpo e a informá-lo de que o ritmo é rápido. Por isso, sigo em frente, peito orgulhoso, olho em frente e tento manter uma boa postura de corrida . Nunca penso no que vou encontrar. Foco-me apenas no presente e tento encontrar, através das sensações, o meu ritmo. Só depois olho para o relógio. Quando olhei estava a 4’20’’. “Bom, Isabel. Agora mantém. No retorno logo pensas no resto”.
Durante o percurso não penso em coisas que me obriguem a puxar pela cabeça e que me tirem-me o foco da corrida. Naquele momento, o mais importante na minha vida é desfrutar do treino e concentrar-me no ritmo. Acontece-me muitas vezes, vir-me uma musica à cabeça e então canto para dentro, ao ritmo da música. É uma técnica ótima. E dá-me prazer. Como vou em velocidade não falo para ninguém, só sorrio. Não gosto nada de descontrolar a respiração, porque isso dá-me dor de burro.
O ciclista motivador
Neste treino de 10 km tive um incentivo especial, que teve alguma graça. Quando cheguei à Fundação Champalimaud e voltei para trás, passou por mim um estrangeiro de bicicleta (vestido a rigor, à ciclista) e disse-me: “You run very fast. Go Girl! Amazing!” (Tu corres muito rápido. Vai, miúda! Fantástico!) Malta, aquilo foi um incríBel gel! Fui logo para um ritmo de 4’09’’. E este tipo de apoio existe muito nas maratonas. Já estou a imaginar a malta das “alemanhas” a puxar por mim… Só preciso de aprender a falar alemão.
Uma das coisas boas deste treino foi o facto de nunca ter sentido que ia quebrar o ritmo, o que é um ótimo sinal. Aliás, isto diz-me até que se calhar poderia ter ido um pouco mais rápido nos primeiros quilómetros, a 4’15’’, talvez. Mas lá está, sou muito prudente nas minhas corridas. Às vezes até demais. Tenho de aprender a arriscar um pouco mais. Um dia chego lá, preciso de tempo.
A sensação de chegar ao fim
Quando terminei, lembro-me de dizer orgulhosamente para mim: “Máquina!” Afinal, não é assim tão impossível. Sentia-me ofegante, mas com a certeza de que a recuperação iria demorar alguns segundos apenas. Sentia-me com energia, capaz de correr mais um quilómetro ao ritmo do quilómetro 10. Mas depois eu já só queria duas coisas: um mergulho no mar e fazer um gaaaaanda instastory para partilhar a minha alegria convosco. É verdade. Muitas vezes, nos últimos quilómetros eu penso em vocês. Penso assim: “Agora, não vais quebrar. Tens a malta à tua espera nas redes”. Partilhar a minha preparação convosco é um fator de motivação para mim. Sinto que tenho outro compromisso e isso, para mim, é altamente produtivo.
Correr rápido pede sapatilhas rápidas
Seja para séries, seja para treinos curtos e rápidos, depois de várias experiências, encontrei os meus ténis preferidos, os novos Tartherzeal da Asics. Para mim, não servem para maratonas e dificilmente as usaria numa meia maratona. São muito leves, respiráveis e sinto-me segura quando corro com eles. Mas também vos digo, estes ténis são bons para malta que corre com alguma velocidade e com muita leveza. Caso contrário, não se tira partido da tecnologia da sapatilha.
Cada sapatilha para o seu treino
Mas se os Tartherzeal são perfeitos para estes treinos mais curtos e mais rápidos, não quer dizer que os use sempre. Por exemplo, esta mesma semana corri 15 Km a ritmo regenerador (recuperação ativa), no meu caso a 5’00’’ min/km. Como não era um treino rápido, já corri com os Asics Kayano 25, uns ténis que têm mais amortecimento e dão outro conforto.
As minhas conclusões deste treino
Este meio treino terminou como eu queria. Fiz os 10 km em 42’12’’, o que me obrigou a sair da zona de conforto e só me trouxe benefícios: Melhorei o meu VO2 máximo (a capacidade de levar oxigénio para os músculos), melhorei o meu ritmo confortável, melhorei a minha concentração e perdi o receio de correr rápido (sim, eu fico sempre ansiosa quando sei que tenho de correr em alta velocidade).
Um vez mais, chego a esta conclusão: só não fazemos aquilo que não queremos.