Certamente que já ouviram dizer que o intestino é o nosso “segundo cérebro”, devido à sua capacidade de influenciar a saúde digestiva, mas também a saúde mental e emocional. Vamos, então, desvendar os segredos de como esses dois sistemas podem trabalhar em harmonia de forma a serem promotores da nossa saúde e bem-estar.
No seu livro O Segundo Cérebro, o professor e investigador Michael D. Gershon, considerado como o pai da neurogastroenterologia, relata as relações do cérebro com o sistema gastrointestinal. Nele, é descrito o papel importante da fisiologia do intestino, que desempenha funções neurotransmissoras, nomeadamente na produção de serotonina, que está a cargo deste órgão em cerca de 90% (os restantes 10% estão dependentes do cérebro). Para além da serotonina, o intestino produz outras substâncias importantes, em interacção com o cérebro, que garantem o bem-estar integral do indivíduo, nesta maravilhosa e complexa articulação.
Benilde Santos, especialista AyurvedaÉ a serotonina que promove a alegria de viver. Em défice da mesma, as depressões manifestam-se, sendo habitual o recurso a medicamentos anti-depressivos que, com frequência, não resolvem o problema, na medida em que as sua actuação não vai ao cerne da questão. Nalguns casos, produzem, inclusive, o efeito contrário ao desejado e/ou efeitos secundários diversos e de difícil previsibilidade.
A LIGAÇÃO ENTRE O CÉREBRO E O INTESTINO
Está provado que o cérebro e o intestino trocam informações e se influenciam mutuamente através de uma complexa rede que incide nos sistemas imunitário, nervoso e endócrino. Desde 2003 foram publicados mais de 2000 artigos científicos sobre este tema, dando à investigação sobre o microbioma uma grande força. Há dois nomes que se destacam bastante neste tema: John F. Cryan e Ted Dinan, dois dos investigadores que têm contribuído significativamente para os estudos sobre a conexão entre o cérebro e o intestino e que descobriram que as bactérias intestinais têm um papel fundamental na regulação do sistema nervoso central.
Entendemos assim que o intestino também tem neurónios que podem não ser capazes de raciocinar, mas são capazes de sentir e de enviar informação ao nosso sistema nervoso para que ele possa agir – dando-se uma comunicação continua. Mas como? Através de um complexo sistema de sinais neurais, substâncias químicas e vias de comunicação. Vamos explicar:
Essas diferentes formas de comunicação permitem que o cérebro e o intestino influenciem e sejam influenciados mutuamente. Alterações no intestino podem afetar o humor, o comportamento e a função cognitiva e vice-versa: o nosso emocional e mental também afeta a função gastrointestinal. Assim sendo, a compreensão dessa comunicação complexa é fundamental para promover a saúde e o bem-estar em ambos os sistemas.
MICROBIOMA INTESTINAL
O microbioma intestinal é composto por trilhões de microorganismos que têm a capacidade de produzir substâncias químicas. Este é um componente vital dessa conexão. Quando essas substâncias químicas são liberadas pelo microbioma, elas podem viajar pelo corpo, incluindo a corrente sanguínea, e chegar ao cérebro. Lá, elas interagem com os neurônios e as células cerebrais. Através desta, o microbioma intestinal pode influenciar o humor, o comportamento, a cognição e até mesmo a ocorrência de doenças neurológicas.
Além disso, o microbioma intestinal também pode afetar o sistema imunitário. Quando ocorrem inflamações ou desequilíbrios no intestino, isso pode ativar uma resposta, resultando na liberação de moléculas inflamatórias. Essas moléculas inflamatórias também podem afetar o cérebro e desempenhar um papel na regulação do humor e da função cerebral.
A Influência Recíproca entre o Cérebro e o Intestino
A relação entre o cérebro e o intestino é bidirecional, o que significa que o estado de um afeta o outro de forma significativa. Por exemplo, o stresse e a ansiedade podem desencadear alterações no intestino, levando a sintomas digestivos.
Da mesma forma, problemas intestinais, como o desequilíbrio do microbioma ou inflamação intestinal, podem enviar sinais ao cérebro, levando a alterações no humor, no sono e na função cognitiva.
António DamásioO mundo dos sentimentos está totalmente ligado ao intestino.
Percebemos, assim, a importância que esta influência de “dois sentidos” tem para o nosso bem-estar no momento (o nosso humor, o nosso equilíbrio mental e emocional) – assim como para a nossa saúde no geral ou a longo prazo. Compreender a ligação entre o cérebro e o intestino é, assim, essencial – uma vez que ao cuidarmos do intestino e do seu microbioma, podemos apoiar a função cerebral e melhorar diversos aspectos de nossa vida.
Mais uma vez, vemos que há pilares da nossa vida que são fundamentais para o nosso bem-estar e equilíbrio geral. Neste caso, também a forma como nascemos (parto natural ou cesariana) e nos alimentamos nos nossos primeiros meses de vida (com ou sem mama, açúcares e sal), o nosso estilo de vida atual, os nossos hábitos alimentares, a forma como nos medicamos (o uso de antibiótico) e a forma como nos exercitamos