Na DoBem, acreditamos que também é urgente olhar para o masculino. Não apenas para o papel do homem na sociedade, mas para o que se passa dentro dele: emoções não expressas, feridas antigas, medos que se escondem atrás da força. Será que há falta de oportunidade e acolhimento quando se trata de falarmos das emoções e vulnerabilidades dos homens?
Foi por isso que convidámos o Alberto Azevedo — facilitador de círculos de homens e profundo conhecedor de várias abordagens terapêuticas e energéticas — a escrever esta crónica.
Porque sabemos que precisamos de mais espaços onde os homens possam escutar e ser escutados, cair e reerguer-se, sem julgamento.
Nesta partilha, o Alberto fala-nos do seu próprio caminho. E mostra-nos que, por vezes, a maior força está em reconhecer a própria vulnerabilidade. Esta crónica é um convite a todos os homens que estão prontos para tirar a armadura. E a todas as mulheres que querem compreender.
Durante muito tempo, caminhei sozinho. Não por escolha consciente, mas por falta de alternativa. Procurava respostas para perguntas que nem sempre sabia formular. Sentia dentro de mim uma inquietação, uma espécie de vazio disfarçado de força e uma vontade genuína de me conhecer.
Mas quando comecei esta viagem de autoconhecimento, percebi que havia muitos caminhos para o desenvolvimento pessoal… e poucos, muito poucos, voltados ao universo masculino.
Chamo-me Alberto Azevedo. Hoje facilito círculos de homens e trabalho com numerologia sistémica, xamanismo, astrologia, meditação, constelações, psicologia junguiana e PNL. Tudo começou com uma necessidade pessoal: entender quem sou e porquê sou assim. E nesse processo de mergulho, encontrei não apenas o que havia em mim… encontrei outros homens. E aí tudo mudou.
Os círculos masculinos surgiram como uma resposta a essa ausência de espaço. São encontros onde homens se reúnem para falar do que não se fala. Emoções, dúvidas, dores, bloqueios, medos. São espaços de partilha sem julgamento, onde percebemos que as nossas questões não são só nossas. Onde se quebra o mito do “homem forte” que aguenta tudo calado. Onde se permite cair a armadura.
Lembro-me dos primeiros encontros. Havia silêncio, resistência, vergonha até. Homens habituados a esconder sentimentos, a conter lágrimas, a resolver tudo sozinhos. Mas bastava um abrir o peito e falar da sua dor para que os outros também se autorizassem. É como se, naquele círculo, reconhecêssemos um espelho e nos víssemos com mais verdade do que em anos de vida lá fora.
Trabalhar o masculino é urgente. Vivemos uma crise de identidade masculina. Não sabemos o que é “ser homem” e talvez nunca tenhamos sabido de verdade. Fomos ensinados a ser duros, a competir, a calar. Mas essa masculinidade, tão celebrada e reproduzida, muitas vezes nasce da ferida, não da força. Confundimos poder com controlo, autoridade com agressividade e o reprimir com autocontrolo.
Ao contrário do que muitos pensam, este trabalho não é para “ensinar a ser homem”. Homens todos nós já somos – e eu sou só mais um. O que fazemos é criar espaço para nos tornarmos os homens que queremos ser. Homens com virtude, como dizia Marco Aurélio: com sabedoria, justiça, força interior e temperança.
O livro O Cavaleiro da Armadura Enferrujada tocou-me profundamente. Fez-me ver que muitas das minhas camadas de proteção eram apenas isso – proteções. Barreiras que me impediam de andar com leveza, de ser visto, de me ver. A armadura muda-nos por fora, mas por dentro continuamos presos. Só quando escolhi pôr a armadura de lado é que comecei, de facto, a transformar-me.





Descobri que dentro de mim, como em todos os homens, há arquétipos poderosos. Energias ancestrais que nos moldam: o guerreiro, o mago, o rei, o amante. Todos com luz e sombra. Através deles, comecei a entender os meus comportamentos, as minhas reações, os meus medos.
A psicologia junguiana deu-me linguagem, a numerologia deu-me direção, as constelações mostraram-me os padrões herdados, o xamanismo ensinou-me a ouvir a sabedoria da natureza e dos rituais e os círculos deram-me o espelho.
E é aí que está a grande chave: o grupo. Sozinho, o caminho é mais difícil. Em grupo, há partilha, pertença, escuta. Não há mestres nem gurus. Há homens. Homens reais. Com histórias reais. A dor que um sente ecoa no outro. E nesse eco, cada um encontra cura.
Hoje, vejo cada vez mais homens a chegarem. Muitos ainda chegam desconfiados, defensivos. Mas algo os chama. Talvez porque, finalmente, se começa a perceber que ser homem não é ser invulnerável. É ter coragem para olhar para dentro. E isso… isso é a verdadeira força.
O círculo é um espaço sagrado. Não é terapia, mas é terapêutico. Não é religião, mas é espiritual. Não é um palco, é um espelho.
Acredito que este caminho é para todos. E começa, sempre, com um passo simples: parar, escutar e perguntar com sinceridade: “Quem sou eu quando deixo cair a armadura?”