Vivemos num mundo onde nos esforçamos cada vez mais para trazer consciência às nossas escolhas diárias – desde a alimentação à forma como educamos, consumimos e cuidamos do nosso bem-estar. Mas será que aplicamos essa mesma atenção à nossa intimidade?

A Sexualidade continua a ser um território repleto de tabus, crenças limitadoras e padrões herdados que, muitas vezes, nos afastam da nossa verdadeira essência. É exatamente aqui que entra a Tamar, fundadora de “O Mel da Deusa” e especialista em Sexualidade Consciente e Desenvolvimento Pessoal Feminino.

A Tamar tem dedicado o seu percurso a guiar mulheres e casais na redescoberta do prazer e da conexão íntima de forma livre, autêntica e profunda, sendo a primeira autora nacional a escrever um livro sobre o tema, chamado “A descoberta do prazer através da sexualidade feminina consciente“.

Nesta crónica vais descobrir o que é a Sexualidade Consciente, como ela pode transformar a tua relação contigo mesma(o) e com os outros, e quais os primeiros passos para desbloquear a tua energia sexual e viver a intimidade com mais presença, liberdade e prazer.

O QUE É A SEXUALIDADE CONSCIENTE?

A Sexualidade Consciente é uma abordagem terapêutica e educativa, focada no autoconhecimento e na expansão da consciência. Trata-se de sentir e usar a energia sexual, não apenas para o prazer físico, mas também como ferramenta de cura e evolução pessoal.

Para isso, é essencial uma profunda compreensão e aceitação da própria sexualidade, além da remoção de bloqueios emocionais e físicos que possam impedir o fluxo natural dessa energia.

A SEXUALIDADE É PARA TODOS… E PARA CADA UM

A sexualidade e a forma como nos relacionamos ainda são territórios cheios de tabus, experiências negativas, emoções não processadas e muita desinformação. Por isso, convido-te a respirar fundo, a abrir o peito e a mente para descobrir as admiráveis possibilidades da Sexualidade Consciente.

A Sexualidade Consciente tem tanto uma componente física, baseada no corpo, como holística, compreendendo que somos um sistema energético, emocional e multidimensional.

Aplica-se a todas as pessoas e diferentes dinâmicas relacionais, pois a maioria de nós parte de perceções erradas sobre a sexualidade, tais como:

• Os genitais são tabu e o sexo está ligado à performance.
• A imagem do corpo é avaliada com base em padrões culturais irreais.
• O significado do sexo e da intimidade é imposto por convenções sociais.
• Falta de consciência corporal e conexão com o próprio corpo.

Além disso, é essencial diferenciar as abordagens segundo os papéis de género que a sociedade criou.

OS BENEFÍCIOS DA LIBERTAÇÃO SEXUAL HOLÍSTICA
MULHERES

A Sexualidade Consciente tem um poder revolucionário na psique e na vitalidade da mulher moderna.

Ainda estão muito presentes emoções como a zanga, a vergonha, a culpa e o medo ao lidar com a sua sexualidade. Essas emoções estão guardadas no corpo e, por mais que se “limpe” a cabeça de crenças caducas, o corpo – muitas vezes – não acompanha essa libertação.

É aí que entra o trabalho corporal sexual. Através de técnicas de ativação da energia sexual, pela respiração, movimento, som e toque, as emoções que estiverem estagnadas e as memórias que estiverem cristalizadas são trazidas à consciência e a transformação acontece.

As áreas de transformação que a Sexualidade Consciente promove não se limitam ao sexo em si. Ao ter como matéria-prima a energia sexual, temos algo que atua nas áreas de vida que, naquele momento, naquela fase de vida da mulher, precisam ser curadas e empoderadas.

Assim, para a mulher, os benefícios estendem-se a:

  • Estreitar positivamente a relação com o próprio corpo;
  • Capacitar para a expressão das várias facetas da sua personalidade e para assumir e gerir plenamente as suas emoções;
  • Religar-se ao legado/história das suas antepassadas e ressignificar a sua própria história íntima;
  • Ser e manter-se inteira num relacionamento amoroso;
  • Integrar o que parece uma dicotomia fraturante – a mãe e a amante;
  • Entender verdadeiramente que propostas trazem as principais fases e idades da vida feminina e que nenhuma delas exclui a manifestação da energia sexual;
  • Conhecer e explorar, com amor e dedicação, a sua própria anatomia sexual e, sobretudo, permitir-se sentir à sua própria maneira (ora mais eroticamente, ora mais sexualmente), sem julgamentos, comparações e cobranças;
  • Compreender como a energia na sua polaridade feminina e masculina se manifesta de forma distinta, mas complementar (uma não é melhor do que a outra, nem uma tem de se subjugar à outra);
  • Canalizar a energia sexual para a criatividade (por exemplo, seja de uma refeição, seja de uma mudança laboral), como autocura, nos rituais pessoais e na abertura à multidimensionalidade da consciência.

PARA OS HOMENS

Se é verdade que a libertação sexual feminina é urgente, devido a séculos de repressão, a sexualidade masculina também precisa de uma reconfiguração.

Culturalmente, e nos comportamentos pessoais, observo múltiplas noções limitativas e estereótipos pouco capazes de expressar os vários ingredientes de que o homem precisa para a sua satisfação e plenitude na intimidade.

Quer na pornografia, quer no cinema e nos meios de comunicação, é retratado um homem musculado, ostentando sinais de status e com muita potência sexual. Esta é uma visão materialista e orientada para o resultado e o desempenho, em que agir é mais valorizado do que sentir.

As consequências evidentes da sexualidade masculina condicionada são:

  • Pressão para corresponder a todo o tempo ao ideal de homem forte e viril;
  • Emoções reprimidas, porque ser vulnerável não corresponde aos papéis masculinos;
  • Carência de toque amoroso;
  • Incapacidade persistente de gerir o ímpeto vulcânico da sua energia sexual, levando a relações sexuais de duração curta e sem ligação emocional;
  • Excitação muito focada no aspeto visual, seja da parceira, seja com a pornografia;
  • Motivação primária para o sexo como descarga fisiológica da energia sexual;
  • Parcerias sexuais pobres, com ausência de intimidade emocional e a consequente sensação de vazio.

O sexo não é algo que se faz. É uma conexão que nutre e expande. Por isso, não tem a ver apenas com a função dos genitais. Pede a abertura e a recetividade do coração. É a partir do coração que mostramos quem somos, podemos ligar-nos à outra pessoa e a conexão, que não é palpável – mas que se sente –, acontece.

Devido a condicionamentos culturais, sentir e expressar emoções é um território estranho ou desconfortável para a maioria dos homens. Está normalizado que os homens expressam fisicamente interesse e amor, o que muitas vezes, se limita ao sexo. Também por força dos papéis sociais, os homens foram impulsionados a agradar a mulher. A satisfação dela ativa-lhes a força e o poder e sossega-lhes o medo predatório de perdê-la para outros homens.

A Sexualidade Consciente para os homens oferece a possibilidade de descoberta do próprio corpo e do seu órgão genital à luz de conceitos positivos, de ligação à energia erótica e ao sentir que é precisamente a chave para melhor conduzir a energia sexual e partilhar intimidade emocional.

A adesão de mais homens a esta via de desenvolvimento pessoal está profundamente ligada à desvinculação a tabus e à abertura à noção de que todo o corpo foi feito para sentir prazer e que, se querem ser melhores amantes para si mesmos e nas suas parcerias, terão de trilhar o caminho da abertura do coração, da exposição vulnerável, da sensibilidade aos ritmos e necessidades da outra pessoa.

No fim, entenderão que isso também é ser viril!

O QUE É A INTIMIDADE?

A intimidade não é só física. Nem a intimidade física é só sexo. Mas parece que ficou reduzida a isso. A intimidade tem a ver com dar-se a conhecer e receber a outra pessoa. Pode ocorrer por proximidade física, ligação emocional, partilha de ideias e de rituais.

Ela é essencial não só para o amor, mas também para o desejo. Afinal, não há desejo que se incendeie apenas com preliminares.

O desejo é uma resposta ao estado da nossa vitalidade, imaginação, atenção aos sentidos e satisfação connosco mesmos, com o outro, com a relação e com a vida em geral.

Contudo, parece que esta característica multifatorial afeta mais as mulheres do que os homens, e está tudo bem. É caso para acertar os passos da dança!

Para sentir desejo sexual, a mulher precisa, geralmente, de sentir primeiro a ligação emocional, a troca empática e vulnerável, seja através de conversas, seja por meio de carícias e romance.

Se já havia esta atitude, aceite comumente, de apenas fazer gestos afetuosos e românticos na etapa da conquista, agora, com a falta de tempo e o desejo de gratificação instantânea, parece que ficaram mais comprometidos passos essenciais da experiência afetivo-sexual.

Então, praticar intencionalidade e dedicação é urgente. O bom sexo não acontece por acaso nem espontaneamente (sobretudo em relacionamentos longos).

Como já dizia a canção: “Para ser divino, há que aprender a ser humano”.

Com consciência sexual, podemos lembrar que somos o infinito encarnado e vitalizado através do prazer. E isso é sagrado!


A Tamar é especialista em Sexualidade Consciente e Desenvolvimento Pessoal Feminino, Socióloga – sendo formadora certificada.

Fundou “O Mel da Deusa” em 2012, dá consultas de Sexualidade Consciente individuais e para casais e promove formações e retiros.

Em 2021, tornou-se a primeira autora portuguesa de Sexualidade Consciente, com o livro «O Mel da Deusa – a descoberta do prazer através da sexualidade feminina consciente».

O seu sonho é inspirar as mulheres a serem elas mesmas, através da sua autodescoberta e empoderamento.